quarta-feira, 17 de junho de 2009

O DIÁRIO DE SHIRLEY MARABRASTEIN


Meu Querido Diário:


Amo tanto e com tal força em mim que não consigo, efetivamente, amar ninguém. Porque nunca me senti amada.

O amor que tenho em mim me torna grande, capaz de amar em quase-dor àquele que menos se imaginaria amado por mim. Mas, esse amor, feito de quases e antropofagias, pede para ser amado. Então, como folha em mítico outono, caio no chão e a chuva me apodrece.

Assim, não amo Alberto desde que o conheci e disse-lhe isso no primeiro momento enquanto, com sorvos curtos, bebericava uma bebida verde com gim.

"Não posso amar, Alberto. Nem sequer posso vir a amar você".

O amor me machuca, me fere, me assusta. Olho estarrecida os casais de apaixonados já prevendo as inúmeras dores que irão sentir. O amor faz doer. E eu me alimento de sorrisos da vida.

Então, passeio pela Oscar Freire olhando as vitrines e me sentindo traída por aquelas roupas que se deixam amar por mim.

Incomoda-me o frio e eu gostaria de andar descalça pela paulista ou de contar uma piada ao segurança do meu prédio que me abre a porta com aquele sorriso de quem é muito feliz, mas se nega a contar o segredo.

Saberá ele que consigo amá-lo tanto que chega a doer exatamente porque não o conheço?

Meu darling, diário, diário meu, existirá alguém tão assim como eu?

sábado, 13 de junho de 2009

CONFISSÕES DE JEFFERSON

SEGURANÇA DE PRÉDIO DE LUXO


Olho para a cara desses ricos que moram aqui e me violento sorrindo para o sorriso deles. Abro-lhes o portão, alguns me olham, outros nem isso; alguns me cumprimentam, outros nem isso. A todos sorrio. Sorrio com nojo da pose de ricos que têm, com o ar assustado com que andam na rua, com a necessidade de se mostrarem superiores, com suas roupas espalhafatosamente luxuosas e incoerentes. Os ricos, neste prédio, são incoerentes. E eu, eu sorrio, violentando-me e com nojo.

Olho-os a todos e sorrio.

Guardo até alguns gracejos mais espirituosos para aqueles de quem tenho maior pena. Sim, de alguns deles eu tenho profunda pena. São uns coitados sem saberem que o são. Ah, ganharão muito, mas muito mais do que eu, mas não sabem - e está no rosto, estampado, que não o sabem - e não sabem dar valor a um Brahms e nem a uma Brahma. Ele riem, mais por pena do que por acharem graça. Trocamos piedades. Eles têm pena de minha pobreza e eu da deles. Pena e nojo.

Mas guardo maior rancor àqueles que me olham com um ar de insuportável superioridade e nem me suportam. Apenas me ignoram. Ignoram-me com medo de ignorar-me. Ignoram-me certificando-se de que eu percebi que estou sendo ignorado. Ignoram-me porque apenas sabem ignorar-se.

Eu a todos sorrio: com este misto de pena, nojo e auto-violência. Cai o pano das encenações todas as vezes que volto para a minha casa e lá, inimaginável aos ricos do prédio onde trabalho, ouço Brahms e bebo Brahma...

sexta-feira, 12 de junho de 2009

AS REFLEXÕES DE TINHO, O BONITINHO...

Não me entendam mal. Eu gosto de pobres. Não tenho nada contra eles. Acontece que não os entendo. Eu me esforço, palavra que sim, mas não os entendo.

Os pobres são engraçadinhos, com suas roupas mal combinadas e seu jeito espalhafatoso de falar. Isso quando falam alguma coisa. Na maior parte do tempo, os pobres se limitam a devolver ao mundo, de modo muito mal preparado, uma série de lugares-comuns que escutaram na novela ou no Fantástico. Além disso, pobre adora fazer poses estranhas na hora de tirar foto. Normalmente ficam parecendo subprodutos de uma loja de horrores. Veja a foto ao lado: você bate o olho e já sabe - é pobre!
Como disse, é impossível entender um pobre: por que eles têm que sempre parecer pobres? E isso, mesmo quando têm dinheiro. Sim, porque há que distinguir: pobres com dinheiro e pobres sem dinheiro. Alguns deles começam (não consigo entender por quê) a ganhar dinheiro e se tornam "novos-ricos". Novos-ricos são pobres que esqueceram que são pobres ou são pobres que têm dinheiro. No fundo, dá no mesmo.

Os novos-ricos continuam sem saber combinar a suas roupas e, pior, continuam falando espalhafatosamente. Não. Pior ainda. Continuam digerindo mal e porcamente uma série de bobagens que ouviram na novela e no Fantástico e devolvem-nas ao mundo, achando que estão agradando. Não. Pior ainda. Agradam à maioria. E quando eles falam de como Miami é legal e como Paris é chata.

Ainda que não entenda nem uns nem outros, prefiro os pobres sem dinheiro do que os pobres com dinheiro ou novos-ricos. Gostar de todos, eu gosto, afinal, eles são tão engraçadinhos... mas não os entendo...

quarta-feira, 10 de junho de 2009

O DIÁRIO DE SHIRLEY MARABRASTEIN


Querido diário:


Hoje não me aconteceram muitas coisas. ADORO! De importante mesmo, o fato de que fiz a minha lavagem mensal da vagina. A minha, é claro.

Deixa eu te explicar: uma vez por mês eu lavo a minha vagina com detergente neutro. É uma cerimônia muito solene. Mas, singela. Nunca convido ninguém para assistir, mas sempre me imagino em praça pública, lavando a vagina diante do presidente da república. Isso é normal? Defina-me normalidade! Amarelou, né?

O problema todo é que se você compra uma saia verde, automaticamente, você é taxada de ecológica. Eu sou consumista. Quero apenas comprar uma saia verde para ir na balada, no sábado. Então, meu pinguim de geladeira será meu companheiro para assistirmos televisão de noite. Programas femininos, claro!

Desconfio que o meu pinguim de geladeira se masturba pensando em mim, mas acho que é paranóia minha. Assim mesmo, vou vigiá-lo sem que ele perceba. Espero!

Estou cansada, a limpeza da vagina, no entanto, ficou ma-ra-vi-lho-sa!

Sinto-me free!

MANIFESTOS DE SARMENTO






Artigo único: A elite brasileira fede.

Artigo complementar: nunca é dia internacional da mulher!



Reflexões pós-modernistas:


Senhora, compre um perfuminho da avon para tirar esse cheiro de hipocrisia!
Disfarce seu jeito de ignorante com um perfume Dior.

Mantenha a ignorância: Sempre fale o óbvio!

Lave os pés: dos outros!

Diga que gosta muito de ler, mas nunca tem tempo.

Não esqueça: fale que não gosta da arte moderna!


Tome muitos banhos, mas lembre-se: o seu cheiro de podre não vai sair.
Recomende que outros tomem banhos!
Seja puritana: diga que antigamente o mundo era muito melhor!

Compre mais um perfume, CH, para acabar com os recalques latino-americanos.

Fale mal de Paris e dos franceses e comemore, nostálgica, o ano da França no Brasil.

Tome outro banho.
Esfregue bem a vagina.
Tinja o cabelo e estique-o muito: vingue-se em si mesma!

Aperte a descarga e vá junto!

AS REFLEXÕES DE TINHO, O BONITINHO...


Do meu carro vejo umas crianças chatas me ameaçando a paz. Torço para o semâforo permanecer aberto para que eu possa passar. Mas, não, claro que não! Seria pedir demais... agora uma daquelas crianças chatas vai vir me pedir alguma coisa. E eu vou ter de dizer que não e isso me irrita.

Aliás, pobreza, de um modo geral, me irrita. Por que as pessoas não nascem todas ricas? Mas, não, ficam aí, os pobres se multiplicando e me irritando. Pobre é uma tristeza... Ficam inventando onda... Como esse infeliz aí ao lado. Tá achando que é MP3, meu santinho?
Se ao menos os pobres se vestissem bem! Mas, não! Olha o pobre querendo combinar capa com camiseta... Pode? E isso é jeito de fechar uma capa? Parece até um cobertor! Olha! É um cobertor! E esse chapéu? Ninguém merece!

Veja só, vem uma criança ranhosa pedir 'uma ajuda' e nem sequer está devidamente vestida! Uma ajuda! A única ajuda que eu poderia das seria o endereço de uma boa loja nos jardins. Mas nem sempre consigo ser tão caritativo e gastar meu tempo dando informações.

O outro dia, pula diante de mim ou cai do inferno, sei lá, uma mulherzinha pedindo uma ajuda para comer. Aí não resisti. Na melhor das intenções, ajudei-a, claro. Disse-lhe "fia, vai já, imediatamente, fazer as unhas, o cabelo e comprar um vestido novo... Armani, acho que você ficaria bem de Armani. Entra num taxi e vai até o DOM. Lá você, mesmo esquisita, gostará do que irá comer! Mas vai agora que você precisa de muita ajuda para vir a comer bem!"

Ela, a mulherzinha, se invocou! Imagine-se uma coisa destas! Ela pediu uma ajuda; eu, ajudei. Ela não queria DOM, é um direito dela... poderia escolher um outro restaurante. Jardins, é claro!