sábado, 13 de junho de 2009

CONFISSÕES DE JEFFERSON

SEGURANÇA DE PRÉDIO DE LUXO


Olho para a cara desses ricos que moram aqui e me violento sorrindo para o sorriso deles. Abro-lhes o portão, alguns me olham, outros nem isso; alguns me cumprimentam, outros nem isso. A todos sorrio. Sorrio com nojo da pose de ricos que têm, com o ar assustado com que andam na rua, com a necessidade de se mostrarem superiores, com suas roupas espalhafatosamente luxuosas e incoerentes. Os ricos, neste prédio, são incoerentes. E eu, eu sorrio, violentando-me e com nojo.

Olho-os a todos e sorrio.

Guardo até alguns gracejos mais espirituosos para aqueles de quem tenho maior pena. Sim, de alguns deles eu tenho profunda pena. São uns coitados sem saberem que o são. Ah, ganharão muito, mas muito mais do que eu, mas não sabem - e está no rosto, estampado, que não o sabem - e não sabem dar valor a um Brahms e nem a uma Brahma. Ele riem, mais por pena do que por acharem graça. Trocamos piedades. Eles têm pena de minha pobreza e eu da deles. Pena e nojo.

Mas guardo maior rancor àqueles que me olham com um ar de insuportável superioridade e nem me suportam. Apenas me ignoram. Ignoram-me com medo de ignorar-me. Ignoram-me certificando-se de que eu percebi que estou sendo ignorado. Ignoram-me porque apenas sabem ignorar-se.

Eu a todos sorrio: com este misto de pena, nojo e auto-violência. Cai o pano das encenações todas as vezes que volto para a minha casa e lá, inimaginável aos ricos do prédio onde trabalho, ouço Brahms e bebo Brahma...

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